Autor: | Nikulin, Andrey |
Data: | 2020 |
Título: | Proto-Macro-Jê: um estudo reconstrutivo |
Detalhes: |
Orientação: Flávia de Castro Alves |
Arquivo enviado pelo autor em abril de 2020
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O tronco Macro-Jê é um dos principais agrupamentos linguísticos do leste sul-americano. Estudos histórico-comparativos das línguas desse tronco encontram-se numa fase ainda incipiente. Em particular, não há consenso na comunidade científica quanto a sua constituição exata, motivo pelo qual diversos autores têm caracterizado o tronco Macro-Jê como uma “hipótese em construção” (cf. RODRIGUES, 1999, p. 165) ou até mesmo como o “caput mortuum da linguística sul-americana” (RIVET, 1924, p. 697). Graças a recentes avanços na documentação das línguas indígenas brasileiras e bolivianas, tornou-se possível reavaliar as relações entre as línguas que têm sido incluídas nesse agrupamento.
A presente tese tem por objetivo fornecer uma reconstrução de aspectos da língua ancestral do tronco Macro-Jê, incluindo domínios tais como a fonologia, a morfossintaxe e o léxico. Para tanto, fizemos uso da metodologia tradicional da linguística histórica, aplicando às línguas Macro-Jê o método histórico-comparativo e, quando possível, o método de reconstrução interna; além disso, recorremos à metodologia da Gramática de Construções Diacrônica para a reconstrução da sintaxe. A aplicação desses métodos seguiu os princípios de reconstrução bottom-up com controle externo. Para a investigação das relações entre as línguas cuja afinidade genética não pôde ser demonstrada através do método histórico-comparativo, utilizamos uma ferramenta conhecida sob o nome de lexicoestatística preliminar.
Concluímos que fazem parte do tronco Macro-Jê as famílias linguísticas Jê, Jaikó, Maxakalí, Krenák, Kamakã, Karajá, Ofayé, Rikbáktsa e Jabutí; a família Chiquitana estaria relacionada às famílias supracitadas em um nível mais profundo. Contrariamente a ideias anteriores de alguns autores, excluímos as famílias Boróro, Yaathê, Purí, Guató, Karirí e Otí da proposta, mas não descartamos a possibilidade de uma relação genética distante entre o tronco Macro-Jê, por um lado, e as línguas Boróro, Karirí e Tupí, por outro lado.
Para o Proto-Macro-Jê, reconstruímos um inventário fonológico compreendendo as consoantes */p, m, w, t, n, r, c, ñ, j, k, ŋ/ e as vogais */a, â, ə, ə̂, y, o, ô, u, e, ê, i, ə̃, ỹ, ũ, ẽ, ĩ/. A estrutura silábica máxima do Proto-Macro-Jê reconstrói-se como */CrVC°/, onde */°/ representa a chamada vogal eco. Apenas as não-contínuas periféricas (labiais e velares) podiam formar onsets ramificados com o rótico: */pr, mr, kr, ŋr/.
Morfossintaticamente, o Proto-Macro-Jê era uma língua de núcleo final. Uma subclasse de nomes (os chamados nomes flexionáveis, ou relacionais), uma subclasse de verbos intransitivos (os chamados verbos descritivos) e a totalidade dos verbos transitivos e das posposições exigiam que seu argumento fosse expresso imediatamente à esquerda do tema, ora por meio de um sintagma nominal, ora por meio de um índice de pessoa (*a- 2, *i- 3NCRF, *ta- 3CRF). Reconstruímos ainda o comportamento morfofonológico dos temas iniciados por */j-/, que perdiam sua consoante inicial (consoante temática) quando da ocorrência dos índices de pessoa; os índices, por sua vez, apresentavam alomorfes diferenciados restritos a esses temas (*∅- 2, *c- 3NCRF, *t- 3CRF). Para a primeira pessoa, reconstrói-se a inexistência de índices de pessoa dedicados.
Por último, abordamos a reconstrução da morfossintaxe oracional da língua ancestral das famílias Jê, Maxakalí, Krenák e Kamakã (“Proto-Macro-Jê Oriental”). Foi-nos possível reconstruir quatro construções encabeçadas por verbos, ou quatro tipos de orações. Em contextos de subordinação sintática, as orações seguiam um padrão ergativo-absolutivo de alinhamento morfossintático; os verbos que as encabeçavam recebiam marcação explícita de não-finitude. As orações finitas (independentes de padrão geral, imperativas e coordenadas) apresentavam uma cisão intransitiva, a qual se manifestava na codificação diferenciada do único argumento de duas subclasses de predicados monovalentes. As orações imperativas divergiam daquelas de padrão geral no que tange à expressão de seu argumento agentivo (A/SA), obrigatória nas ora-ções de padrão geral e inibida nas imperativas. As orações coordenadas conectavam-se às an-teriores por meio de um elemento que rastreava a identidade do sujeito (argumento nominativo, A/S), configurando, assim, um padrão de referência cruzada. No caso de sujeitos correferentes, utilizava-se a conjunção *nẽc (~ -j, -ñ) ‘e.MS’, ao passo que o argumento agentivo da oração subsequente não se expressava explicitamente. A não-correferência entre os sujeitos marcava-se por meio da justaposição das orações, sendo a oração subsequente introduzida por um pro-nome agentivo ou (na terceira pessoa) pelo elemento conector *mə̃ ‘e.SD
Arquivo enviado pelo autor em abril de 2020
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