herança social, mas de uma iniciativa de criação consciente e artificial. Quase tudo o que se sabe da língua gótica é o que contêm os fragmentos da tradução da Bíblia, feita pelo bispo WULFILA no século IV. Mera versão de um texto hebreu-greco-latino, que nada representa da cultura gótica, texto "artificial", ninguém entretanto lhe recusará o máximo interêsse lingüístico: lá está eternizado o mecanismo gramatical, o material sonoro e grande acervo vocabular de um idioma extinto. Também nos documentos missionários, a artificialidade não atinge a medula da língua. Confina-se dentro do vocabulário, e isto mesmo só em casos excecionais. Tendo sido indispensável aos Padres fazerem-se entender, em assunto inteiramente novo para os índios, não é crível que se dessem ao trabalho de compor, corrigir, limar por anos fio, e afinal imprimir, com tantos sacrifícios, cousas que não tivessem sentido para os destinatários. Convimos apenas que, não a organização interna das orações, mas sim a seqüência dos períodos, a trama ou técnica do discurso obedecem às tradições literárias ocidentais. A distinção entre vocabulário e material gramatical é familiar aos filólogos patrícios e por êles invocada quando querem contestar influência tupi no português do Brasil. É o que diz, p. ex., o prof. ERNESTO DE FARIA neste parecer típico:
Observem-se as seguintes confusões: 1.°) chama-se à fonética, morfologia e sintaxe "processos gramaticais"; 2.°) considera-se o vocabulário algo estranho à lingua e à lingüística: portanto uma penetração de dez mil vocábulos de uma língua em outra língua |
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